Lua Cheia I

on sábado, 25 de dezembro de 2010
Mas era tão difícil acreditar. As pessoas podem dizer o quanto quiserem: "Se você quer realizar um sonho, basta querer". Basta querer... será?

Ele não podia simplesmente desvincular sua vida particular da vida de seus familiares... "Queria" - pensava. Alguns segundos depois, recriminava-se pelo que dissera, mesmo sabendo que talvez fosse mais fácil concretizar os seus objetivos sem ter que se preocupar com a sua família. Atender um ou outro membro desta sem ganhar absolutamente nada em troca, a não ser o tão fácil e simples: "Obrigado". Às vezes tentava esquecer todos esses devaneios, apenas seguir em frente, realizar as suas atividade diárias e pronto. Contudo, não conseguia.

Deseja a solidão como sua companheira; sair da dependência paterna e residir com aquela. Arrumaria seus pertences a seu modo, sem interferências. Ganharia a noite com os amigos sem ter a constante ânsia em saber as horas. Viveria segundo suas regras sob regras maiores envoltas na sociedade.Imaginava-se dono de si, sobre o total controle de suas ações.

Tinha-se posto na cama às 13:20. Havia planejado iniciar os estudos de Matemática às 16. Porém, várias palavras e imagens batiam à porta de seus vislumbres, tão matematicamente incalculáveis e inesperados. O tempo já denunciava a chegada da noite que traria consigo algumas belas estrelas e a lua cheia. Gostava da lua assim. Poderia fitá-la e tentar visualizar as crateras de seu corpo amarelado e mergulhar acordado em sonhos inconclusos. Mudara de ideia quanto à Matemática. Decidira ler um livro. O ambiente estava surpreendentemente tranquilo. Os seus irmãos e o seu pai desapareceram. Ficou feliz um instante, mas logo seu semblante mudara, adquirindo a indesejável aparência da melancolia.

Levantou-se da cama e sentou-se na mesa localizada num canto de seu pequeno quarto. Abriu o estojo e sacou de dentro uma caneta azul. Em cima da mesa tinha um caderno, onde escrevia textos diversos, onde transbordava intrépido os seus sentimentos completamente despidos. Jorrava as mais profundas sensações adquiridas ao longo do dia, ao longo da semana, ao longo dos anos. O tempo não importava. Entretanto, nada escreveu. Guardou a caneta azul e ficou a apreciar a beleza hipnótica da lua cheia, que já se mostrava impudica aos olhares graciosos e desregrados dos que se deixam enlear pelas coisas da natureza.

Esquecera-se do livro que ia ler. Nada mais continha significado relevante. Aquela imagem tragou-lhe a sensatez e a razão. Viajava. Achava-se em algum lugar em que, com certeza, voava, pois seu rosto exibia tão singelo um sorriso sem mostrar os dentes frontais. Só um sorriso, que lhe recobrou memórias da criança adormecida em seu âmago, despertada à luz daquele fulgor...

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