Quinta Cidade

on sexta-feira, 18 de maio de 2012
Queria ter escrito este texto ontem quando chegasse a casa, mas o cansaço, a fome e o sono detiveram-me. Pode ser que, agora, as palavras não saiam em sua forma genuína e cálida. Liberá-las-ei do tormento da prisão, onde estavam a gritar e pedir, insistentemente, que eu viesse aqui e desenhasse o quadro da Quinta Cidade o quanto antes.

Bem, cá estou eu a escutar as notas musicais de John Frusciante, o canto dos pássaros; a sentir o vento frio e fresco que entra pela janela a abraçar-me; e a luz do sol a tocar-me o peito, envolvendo-me com seu acalanto apaziguador.

Neste momento, converso com o Tempo e peço-lhe que seu motorista faça o retorno na estrada da minha vida, a fim de que eu retorne às tardes do dia 14 ao dia 17, para que eu veja o estado de minh'alma naquelas dezesseis horas vividas na Quinta Cidade. A irredutibilidade do Tempo é grande e não há argumentos que o faça voltar. Resta-me, só, recorrer às lembranças guardadas e tentar extrair delas o máximo de retratos. É com base nestes que pintarei o meu quadro, o qual ficará sublimemente exposto na parede de um dos quartos da casa Sentimentos Nus.

Começo, finalmente, dizendo que, das cidades pelas quais eu e meus companheiros de viagem, Miguel e Luciana, passamos, a Quinta é a mais vistosa. Tiveram outras, mas não tanto quanto esta ao meu ver. As construções são simples, com alguns poucos prédios a carregar casos e casos; as pessoas são modestas, divertidas, alegres. Elas conseguem imprimir à seriedade do trabalho uma graciosidade única. Não havia espaço ao silêncio prolongado e chato; não havia espaço aos problemas que, normalmente, surgem nas cidades. Os meninos e meninas conseguiram tornar a lida, cuja concepção nua e crua é sacal e triste, algo ornado de um alvoroço bom, gostoso e atraente. Ah, seria maravilhoso se todas as cidades fosse como a Quinta! Sentirei saudades dos chistes, das expressões e das estórias do Idalberto, da Márcia e da Nadja. Esta chegou a contar uma que, aos ouvidos puritanos, seria considerada despudorada, suja e feia. Contudo, à população da Quinta, é a estória mais cheia de pudor deste mundo, por mais que ela contenha o pesado imperativo seguido a risca por muitos que buscam o gozo e a joia.

Acabo de achar graça do que escrevi há pouco. Não contei a estória e não irei contar. A graça não seria a mesma e é melhor que ela fique na Quinta Cidade. Quem quiser saber, tire um dia de folga, compre uma passagem e vá até lá. Não será necessário dinheiro para a compra. Bastarão a sua vontade e a sua curiosidade, se as tiver.

Além das estórias, tínhamos a playlist do Dj. Não ponho o nome dele aqui por não saber como escrever exatamente. Dentre os cantores consagrados que nos fizeram companhia durante os quatro dias que lá passei, tinha o Renato Russo, com sua Legião Urbana a tocar e a cantar pelas ruas e travessas da Quinta, o Humberto Gessinger, com seus Engenheiros do Hawaii a construir, mediante suas canções, a Infinita Highway pela qual a equipe do TJ segue, o Zé Ramalho e outros. Conhecia muitas canções, mas desconhecia o nome destas e quem as compuseram. Se soubesse mais dos meandros da Música, teria pegue meu violão e aventuraria-me em arquitetar uma melodia singela à Quinta logo que cheguei a casa ontem.

Infelizmente, eu, o Miguel e a Luciana não somos de um cidade só. Se pudéssemos - acredito que, aqui, posso falar por eles - ficaríamos na Quinta alguns dias a mais. No entanto, precisávamos e precisamos embarcar em nosso pequeno barco e continuar nossa viagem. Durante esta, tenho feito um inventário de impressões, o qual é bem mais difícil e não há máquina nem código de barra que facilite o estudo e a observação. Por mais que eu grave, o meu sistema, às vezes, trava e as sensações da hora perdem-se, a ficar, tão somente, a vagueza do quadro metamórfico da memória, onde as palavras e imagens misturam-se e consubstanciam-se num único corpo, o meu espírito.

Meus colegas da Quinta, levá-los-ei comigo em minha memória. Caso ficasse bem mais tempo, diria: meus amigos da Quinta, levá-los-ei comigo em meu coração. De uma forma ou de outra, vocês estarão comigo.

Perguntaram-me se escrevia poesia, conto, crônica, etc. Respondi que escrevo apenas. Não penso em gênero... Escrevo. Deixo sob a responsabilidade de vocês, caso queiram, a determinação daquele.

Enquanto escrevia este texto, além do sol e do John, veio a companhia da chuva que, por alguns instantes, afastou o acalanto apaziguador e trouxe o frenetismo de seus tambores, dos quais saiam notas repletas de vida, a partir das quais os pássaros compuseram mais uma obra-prima à Natureza. Tal obra, se eles me permitirem, dedicarei a vocês, a vocês da Quinta Cidade...

1 comentários:

Daniela Filipini disse...

A sinceridade do seu comentário no meu blog, no dia 11 de maio, me fez vir aqui pra agradecer pelo apoio, pela dedicação. Não são muitas as pessoas que se importam em escutar, sabe? E você escutou minhas palavras.
Obrigada.

Dani.

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